sexta-feira, 23 de abril de 2010

DUAS OU TRÊS CAMPANHAS ELEITORAIS, MAS APENAS UMA CAMPANHA POLÍTICA

MAURO LUIS IASI (*)



Não se formará em 2010 a aliança eleitoral
reeditando a “frente de esquerda” que disputou as eleições de
2006, e é preciso que reflitamos sobre as razões deste fato.
Concordo com a recente manifestação do companheiro Badaró (“_A
importância da frente de esquerda em 2010, um chamado aos camaradas
do PCB e PSTU”)_ quando avalia da importância desta tentativa em
2006 e da lógica que nos remete a buscar aglutinar as forças de
esquerda e de oposição ao governo Lula e ao bloco conservador em
uma alternativa eleitoral.



No entanto, há entre nós um entendimento
muito diferente sobre o caráter e a forma de funcionamento desta
suposta frente. Exatamente por considerarmos, nós do PCB, a
importância de resistir contra o bloco conservador e suas
alternativas, seja uma mais retrógrada, representada por Serra, ou
outra, de Dilma, que disfarça o seu compromisso com os grandes
monopólios capitalistas sob um enganoso verniz “social
desenvolvimentista”, seja lá o que isso significa, é que
entendemos a Frente de Esquerda como um esforço permanente de
articulação política e de iniciativas que permitam
o contraponto necessário ao consenso conservador.



Desta maneira, para nós, a frente de
esquerda não pode se limitar a uma mera coligação eleitoral. As
diferentes lutas sociais, formas organizadas ou não de resistência
contra a ação predatória que o grande capital empreendeu contra os
trabalhadores, foi o terreno prático no qual nos encontramos nestes
anos. Na luta contra a flexibilização de direitos dos
trabalhadores, contra a criminalização dos movimentos sociais, na
luta pela estatização de fato da Petrobrás, na solidariedade
internacional (nem todos nós, é verdade), para citar apenas
algumas, constitui-se o espaço de unidade na ação das forças de
esquerda e dos movimentos sociais combativos.



Infelizmente, nem do ponto de vista sindical,
nem do ponto de vista político-eleitoral, esta ação
comum pôde se refletir em graus mais avançados de unidade. Isto
se dá, em parte, por nossas legítimas diferenças e pontos de
vista discordantes sobre importantes aspectos táticos, mas, é bom
frisar, também pela imposição de uma prolongada hegemonia
conservadora que atinge em cheio o movimento dos trabalhadores.



Especificamente sobre a frente eleitoral,
avaliando o cenário de defensiva e as possibilidades conjunturais, o
PCB propôs, no início de 2009, que o melhor a fazer era dar início
a um processo de reflexão e discussão programática, que, partindo
de uma séria avaliação sobre o Brasil, chegasse a eixos de um
programa e ao esboço de um projeto de poder que reinscrevesse o
bloco proletário e popular na luta política em uma perspectiva
transformadora.



Para nós, este processo só poderia ser
iniciado retirando-se TODOS OS NOMES
COLOCADOS e priorizando-se a discussão programática, de maneira
que isto poderia levar ou não a alternativas eleitorais em 2010, mas,
de qualquer forma, acumularia para a construção de uma alternativa
de poder à esquerda, de médio e longo prazo, com mais qualidade e
substância.



O que afirmamos, no momento, é bom que se
esclareça, é isso: estávamos dispostos a participar deste esforço
de reflexão e elaboração coletiva de uma alternativa programática
articulada a um projeto de poder que materializasse a necessidade de
independência e autonomia política dos trabalhadores frente aos
desafios atuais e contra a hegemonia conservadora que se implantou no
Brasil. Caso este esforço coletivo chegasse ao desenvolvimento de
eixos mínimos e entendimento o suficiente para refletir
tal acúmulo em uma candidatura para 2010, o PCB estaria
comprometido em defendê-la. Da mesma forma, afirmamos que, caso o
processo de reflexão e de mobilização pela necessidade de um
programa de transformações no sentido do socialismo e de
estabelecimento de um poder proletário e popular no Brasil
caminhasse por uma dinâmica que fosse além das eleições, isto,
para nós, não seria um problema.



Em NENHUM MOMENTO VINCULAMOS ESTA PROPOSTA
A UM NOME, exatamente porque estávamos propondo um método
político que pressupunha retirar inicialmente qualquer alternativa
de nomes e priorizar o debate programático. E muito mais que isso,
assim propusemos porque avaliamos, e acredito que estávamos
corretos, que a inércia dos partidos que compunham a frente de
esquerda (PSOL, PCB e PSTU) em fazer uma disputa internista para
chegar primeiro a um nome para depois oferecê-lo, como alternativa
aos trabalhadores e aos movimentos sociais, é um profundo erro
político.



Não podemos aceitar “candidaturas
naturais”, “cálculos sobre viabilidade eleitoral”,
hegemonismos de nenhuma espécie ou qualquer outro critério que
venha ocupar o lugar da discussão política e da construção
coletiva de alternativas. Avaliávamos que os trabalhadores estão,
justificadamente, cansados de ser chamados só para votar em chapas
que apareciam como pratos prontos numa engenharia política que
divide o tempo em 90% gastos em conspirações e acertos internos
e 10% numa mera estratégia de buscar apoio eleitoral, colocando os
movimentos sociais, as organizações sindicais e os trabalhadores em
uma posição passiva e manipulatória.



Infelizmente, a inércia venceu a
criatividade política. O PSOL mergulhou num internismo ignorando
qualquer coisa que vicejasse fora dele e resolveu, primeiro, tratar
de seus próprios problemas. Inicialmente, numa cruzada para
convencer Heloisa Helena a manter sua candidatura por conta de sua
“densidade eleitoral”. Depois do insucesso de tal empreitada,
procurou substituir o personagem, mas manteve a lógica do suposto
potencial eleitoral apresentando a alternativa de Marina Silva, que
Badaró corretamente define como alternativa suicida, e, finalmente,
numa fratricida luta interna que sangrou o partido até a definição
de Plínio como candidato.



Durante este tenso processo, o PSOL só pediu
uma coisa à frente de esquerda: paciência. Em nenhum momento a
frente existiu como frente. Ninguém da direção do PSOL, em nenhum
momento, procurou saber o que seus parceiros avaliavam da situação,
em nenhum momento se realizou um balanço das experiências de 2006
que pudesse orientar a formulação de uma alternativa para 2010.
Não digo no sentido de adesão à proposta por nós apresentada, mas
sequer de qualquer sondagem para avaliar o que pensavam os partidos
que compunham a frente. Apenas pediu-se que esperássemos.



Prezamos e respeitamos a autonomia dos
partidos aliados, mas principalmente prezamos nossa autonomia. Como
somos inquietos e rebeldes... não esperamos, construímos
alternativas.



Os pontuais, raros e generosos contatos
limitaram-se a iniciativas pessoais ou de uma ou outra tendência
que antes nos inteiravam do processo conflituoso do que formulavam
ideias e eixos sobres os quais pudéssemos discutir.



O resultado desta disputa interna na
consagração de Plínio como candidato do PSOL é uma boa notícia e
nunca escondemos nossa profunda identidade não apenas com a pessoa e
o militante que é o Plínio, como, em muitos aspectos, com a maneira
como partilhamos a compreensão dos desafios que enfrentamos no campo
da política. No entanto, o momento e a forma como hoje se apresenta
a candidatura do PSOL subverte toda a forma que propusemos no início
de 2009. Apesar de ser um bom nome, é ainda um nome já dado que
busca apoio e não um processo de construção coletiva que
culminaria com um nome que expressasse, na disputa
político-eleitoral, o acúmulo construído.



O tempo que nos separa das eleições
inviabiliza, mais uma vez, uma construção programática e
mobilizatória em torno da construção de uma alternativa de poder
para os trabalhadores. NãO NOS RESPONSABILIZEM PELA NãO
EFETIVAçãO DA FRENTE DE ESQUERDA. Sua inviabilização foi
construída (pacientemente) pelos erros na condução da campanha de
2006, pela incapacidade de ir além de uma mera coligação eleitoral
e se constituir como expressão política possível da unidade de
ação prática desenvolvida, e, finalmente, pela opção de primeiro
definir no âmbito do PSOL o candidato para depois buscar o apoio dos
outros parceiros da Frente.



No entanto, acreditamos que o cenário
definido não inviabiliza uma ação que gere acúmulos políticos em
nossa tarefa de se contrapor ao bloco conservador e na busca de uma
alternativa real de poder para os trabalhadores. Continuamos
convictos que precisamos iniciar um debate sobre quais os caminhos de
construção desta alternativa, que para nós só tem sentido se for
à esquerda e socialista, e concordamos que as eleições são um bom
momento para divulgar e apresentar a necessidade deste debate.



Neste sentido estamos convencidos que a
melhor forma de contribuir neste esforço é com uma CANDIDATURA
PRóPRIA DO PCB que apresente, através de uma campanha movimento,
ou manifesto, de que maneira estamos entendendo o período em que
vivemos e os desafios que temos de enfrentar na perspectiva de uma
revolução socialista no Brasil, assim como o papel que um Governo
Popular tem nesta estratégia de transformação. Um chamamento à
discussão programática e estratégica que leve à formação de
uma frente anticapitalista e anti-imperialista.



Temos certeza que Plínio cumprirá com
dignidade a tarefa que seu partido o incumbiu, assim como aguardamos
que a linha geral de sua campanha seja de questionamento da ordem e
de defesa da necessidade de uma alternativa socialista. Não sabemos
se no desenho de uma alternativa ainda no campo de uma
proposta democrático-popular, como é o que parece se configurar,
ou mais incisivamente socialista, mas de qualquer forma uma campanha
de oposição e de esquerda.



Assim é que, para nós, trata-se de duas
ou três campanhas eleitorais (não por que assim definimos, não era
o que queríamos, mas não fomos convidados a opinar sobre
alternativas que viabilizassem a Frente), mas que podem compor uma
única campanha política pela necessidade
de acúmulo programático e político que nos leve a uma real
alternativa de poder dos trabalhadores.



Os trabalhadores chilenos, na época da
Unidade Popular, cantavam uma música na qual proclamavam que
“desta vez não se trata de mudar um presidente, mas será o povo
que construirá um Chile bem diferente”. Acreditamos que é chegado
o momento de dar um basta nesta inércia eleitoral e começar a
construir reais alternativas de mudança para o Brasil. Não somos
melhores que ninguém e temos a certeza de que precisaremos de todos
os revolucionários para construir esta alternativa.
Apenas decidimos que já era hora de começar, e assim começamos.



*Mauro Iasi
Membro da Comissão Política Nacional do Comitê Central do PCB


Rio de Janeiro, abril de 2010

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