APENAS UMA VISITA?
O presidente da República Islâmica do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, chega ao Brasil no próximo dia 23. Cercada de polêmica, a visita, no entanto, faz parte da rotina diplomática, com ênfase em aspectos geopolíticos e comerciais. Os iranianos estão interessados, por exemplo, em comprar terras brasileiras, num esforço para reduzir a dependência de alimentos. Os brasileiros, críticos da chamada doutrina Bush (que, para a solução de impasses, privilegia coação militar, em detrimento de negociações multilaterais) e de olho nas oportunidades abertas pelo mercado de petróleo, querem se colocar como atores importantes no turbulento Oriente Médio. Para isso, constroem um diálogo direto com o Estado iraniano.
No centro da polêmica, a figura do presidente Ahmadinejad. Suas reiteradas declarações negando o Holocausto e pregando a destruição do Estado de Israel horrorizam quem não se anestesiou pelo antissemitismo. São ataques tolos, que isolam politicamente o Irã e abastecem o mercado da intolerância.
Outro gesto provocador do presidente iraniano foi a recente indicação de Ahmad Vahidi para o ministério da Defesa. Vahidi é procurado pela Interpol desde 2007 por suposto envolvimento no atentado contra a AMIA, em Buenos Aires, em 1994. O ato terrorista deixou 85 mortos.
Sobre o que envolve a presença do presidente iraniano em solo brasileiro, temos a declarar o seguinte:
1. É ingenuidade acreditar que o jogo das relações internacionais é regido por regras humanitárias e/ou por uma (inexistente) ética universal. Goste-se ou não, é business as usual. Não existem “países inocentes”. Alguns dos que hoje criticam o regime iraniano são campeões mundiais na venda de armas, flertaram com o apartheid sul-africano, deram as mãos a Saddam Hussein (quando era conveniente atacar os xiitas iranianos), assessoraram Esquadrões da Morte na América Central, providenciaram golpes de estado no atacado e/ou instruíram serviços secretos homicidas. No entanto, parodiando o Marco Antônio de Shakespeare, são países honrados ...
2. O atual regime iraniano é teocrático, antipopular e antidemocrático. Subverte um dos valores básicos do islamismo xiita: a autoridade islâmica jamais poderia confundir-se com um governo secular. Os clérigos no poder perseguem as oposições e sufocam os movimentos populares.
3. É bom, entretanto, não esquecer que a Revolução de 1979 foi um gigantesco movimento de massas, que não era apenas islâmico na origem. Enxotou do poder o xá Reza Pahlevi. Quem era esse soberano ? Um títere pró-ocidental, que chegou ao trono depois de um golpe de estado patrocinado pela CIA, em agosto de 1953. Entregou as reservas petrolíferas do país a consórcios norte-americanos e britânicos, recebendo em troca proteção para censurar os meios de comunicação, perseguir, torturar e matar seus opositores. Tudo em nome da “ameaça comunista”. Quantos dos que hoje se chocam, com razão, com as arengas de Ahmadinejad, levantaram suas vozes e seu poder de pressão contra Reza Pahlevi ?
4. Fala-se das intenções militaristas do programa nuclear iraniano. É uma preocupação legítima. O arsenal atômico já existente em outros países é capaz de incinerar o planeta mais de uma vez. A dúvida é: por que só o Irã? Defendemos a desnuclearização completa não só do Oriente Médio, mas de todo o mundo. Que não existam mais áreas secretas, proibidas à inspeção internacional. Que se respeitem com rigor as cláusulas do Tratado de Não Proliferação Nuclear. Os países não signatários devem ser pressionados a aderir.
5. Manifestamos nossa solidariedade ao povo iraniano em sua luta por um Estado democrático, que respeite os direitos humanos e promova a justiça social. A conquista da liberdade virá da ação popular organizada, não de intervenções estrangeiras.
Rio de Janeiro, 19 de novembro de 2009
ASA – Associação Scholem Aleichem de Cultura e Recreação
ICUF – Ídisher Cultur Farband (Argentina)
ACIZ – Asociación Cultural Israelita Dr. Jaime Zhitlovsky (Uruguai)
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