quarta-feira, 25 de abril de 2012

LÊNIN E O MOVIMENTO FEMININO

Clara Zetkin 1920 O camarada Lênin falou-me várias vezes sobre a questão feminina, à qual atribuía grande importância, uma vez que o movimento feminino era para ele parte integrante e, em certas ocasiões, parte decisiva do movimento de massas. É desnecessário dizer que ele considerava a plena igualdade social da mulher como um princípio indiscutível do comunismo. Nossa primeira conversação longa sobre esse assunto teve lugar no outono de 1920, no seu grande gabinete, no Kremlin. Lênin estava sentado diante de sua mesa coberta de livros e de papéis, que indicavam seu tipo de ocupação e seu trabalho, mas sem exibir «a desordem dos gênios». «Devemos criar necessariamente um poderoso movimento feminino internacional, fundado sobre uma base teórica clara e precisa» — começou ele, depois de haver-me saudado. «É claro que não pode haver uma boa prática sem teoria marxista. Nós, comunistas, devemos manter sobre tal questão nossos princípios, em toda sua pureza. Devemos distinguir-nos claramente de todos os outros partidos. Infelizmente, nosso II Congresso Internacional não teve tempo de tomar posição sobre esse ponto, embora a questão feminina tivesse sido ali levantada. A culpa é da comissão, que faz com que as coisas se arrastem. Ela deve elaborar uma resolução, teses, uma linha precisa. Mas até agora seus trabalhos não avançaram muito. Deveis ajudá-la.» Já ouvira falar do que agora me dizia Lênin e expressei-lhe meu espanto. Era uma entusiasta de ,tudo quanto haviam feito as mulheres russas durante a revolução, de tudo quanto ainda faziam para defendê-la e para ajudá-la a desenvolver-se. Quanto à posição e à atividade das mulheres no Partido bolchevique, parecia-me que, por este lado, o Partido se mostrava realmente à altura de sua tarefa. Só o Partido bolchevique fornece quadros experimentados, preparados, para o movimento feminino comunista internacional e, ao mesmo tempo, serve de grande exemplo histórico. «Exato, exatíssimo» — observou Lênin com um leve sorriso. «Em Petrogrado, em Moscou, nas cidades e nos centros industriais afastados, o comportamento das mulheres proletárias durante a revolução foi soberbo. Sem elas, muito provavelmente não teríamos vencido. Essa é minha opinião. De que coragem deram provas e que coragem mostram ainda hoje! imaginai todos os sofrimentos e as privações que suportaram. . . Mas mantêm-se firmes, não se curvam, porque defendem os sovietes, porque querem a liberdade e o comunismo. Sim, as nossas operárias são magníficas, são verdadeiras lutadoras de classes. Merecem nossa admiração e nosso afeto. Sim, possuíamos em nosso Partido companheiras seguras, capazes e incansáveis. Podemos confiar-lhes postos importantes nos sovietes, nos comitês executivos, nos Comissariados do Povo, na administração. Muitas delas trabalham dia e noite no Partido ou entre as massas proletárias e camponesas, ou no Exército Vermelho. Tudo isso é muitíssimo precioso para nós. E é importante para as mulheres do mundo inteiro, porque comprova a capacidade das mulheres e o elevado valor que tem seu trabalho, para a sociedade. A primeira ditadura do proletariado abre verdadeiramente o caminho para a completa igualdade social da mulher. Elimina mais preconceitos que a montanha de escritos sobre, a igualdade feminina. E apesar de tudo isso, não possuímos ainda um movimento feminino comunista internacional. Mas devemos chegar a formá-lo, a todo custo. Devemos proceder imediatamente à sua organização. Sem esse movimento, o trabalho de nossa Internacional e das suas seções será incompleto e assim permanecerá. Nosso trabalho revolucionário deve ser conduzido até o fim. Mas, dizei-me, como vai o trabalho comunista no exterior?» Transmiti-lhe todas as informações que havia conseguido recolher; informações limitadas, em virtude dos elos débeis e irregulares que então existiam entre os partidos aderentes à Internacional Comunista. Lênin, um pouco inclinado para a frente, escutava atento, sem nenhum sinal de aborrecimento, de impaciência ou cansaço. Interessava-se vivamente mesmo por detalhes de importância secundária. Não conheço ninguém que saiba escutar melhor que ele, classificar tão rapidamente os fatos e coordená-los, como se podia ver pelas perguntas breves, mas sempre muito precisas, que me dirigia, de vez em quando, enquanto eu falava e pela maneira de voltar depois a algum detalhe de nossa conversa. Ele havia tomado algumas anotações breves. Naturalmente falei principalmente da situação na Alemanha. Disse-lhe que Rosa(1) considerava da maior importância conquistar para a luta revolucionária as massas femininas. Quando se formou o Partido Comunista, Rosa insistiu para que se publicasse um jornal dedicado ao movimento feminino. Quando Leo Jogiches examinava comigo o plano de trabalho do Partido, durante nosso último encontro, trinta e seis horas antes que o assassinassem, e me confiava algumas tarefas a realizar, "incluía também um plano de organização para as operárias. Essa questão já fora tratada na primeira conferência ilegal do Partido. Os propagandistas e os dirigentes mais preparados e experientes, que se haviam distinguido antes da guerra e durante a mesma, haviam permanecido quase todos nos partidos social-democratas das duas tendências, exercendo uma grande influência sobre as massas conscientes e ativas de operárias. Todavia, mesmo entre as mulheres, se havia formado um núcleo de camaradas enérgicas e cheias de abnegação, que participavam de todo o trabalho e da luta de nosso Partido. O Partido, por sua parte, estava desenvolvendo uma ação metódica entre as operárias. Tratava-se apenas do começo, mas de um bom começo. «Não vai mal, de fato não vai mal» — disse Lênin. «A energia, o espírito de abnegação e o entusiasmo das mulheres comunistas, sua coragem e sua inteligência no período da ilegalidade ou de semi-legalidade, abrem uma bela perspectiva para o desenvolvimento desse trabalho. Apoderar-se das massas e organizar sua ação, eis os elementos preciosos para o desenvolvimento e o reforço da partido. Mas, em que ponto estais, no que se refere à compreensão exata da base dessa ação? Como ensinais às camaradas ? Esse problema tem uma importância decisiva para o trabalho que se deve desenvolver entre as massas. Exerce uma grande influência, porque penetra justamente no coração da massa, porque a atrai para nós e a inflama. Não consigo recordar-me agora quem foi que disse: nada se faz de grande sem paixão. Ora, nós e os trabalhadores do mundo inteiro temos ainda, de fato, grandes coisas a realizar. Assim, que anima vossas camaradas, as mulheres proletárias da Alemanha? Em que ponto está sua consciência de classe, de proletárias? Seus interesses, sua atividade se voltam para as reivindicações políticas do momento? Sobre que se concentra sua atenção? A esse respeito, ouvi dizer coisas estranhas, às camaradas russas e alemãs. Devo contar-vos. Foi-me dito que uma comunista muito qualificada publica em Hamburgo um jornal para as prostitutas e tenta organizar essas mulheres para a luta revolucionária. Rosa agiu como comunista ao escrever um artigo no qual tomava a defesa das prostitutas, que são lançadas à prisão por infrações a qualquer regulamento da polícia referente à sua triste profissão. Duplamente vítimas da sociedade burguesa, as prostitutas merecem ser lamentadas. São vítimas, antes de tudo, do maldito sistema da propriedade, depois do maldito moralismo hipócrita. Somente os brutos ou os míopes podem esquecê-lo. No entanto, não se trata de considerar as prostitutas como, por assim dizer, um setor especial da frente revolucionária e de publicar para elas um jornal especial. Será que não existem, talvez, na Alemanha, operárias industriais para organizar, para educar com um jornal, para arrastar à luta? Eis aí um desvio mórbido. Isso me recorda muito a moda literária em que toda prostituta era apresentada como uma doce madona. É verdade que mesmo naquele caso a 'raiz' era sã: a compaixão social, a indignação contra a hipocrisia virtuosa da honrada burguesia. Mas essa raiz sã, sofrendo a contaminação burguesa, apodreceu. Em geral, a prostituição, mesmo no nosso país, colocará diante de nós numerosos problemas de difícil solução. Trata-se de reconduzir a prostituta ao trabalho produtivo, de indicar-lhe um lugar na economia social; o que, no estado atual de nossa economia e nas condições atuais, é uma coisa complicada e dificilmente realizável. Eis portanto um aspecto da questão feminina que, depois da conquista do poder pelo proletariado, se apresenta em toda a amplitude e exige solução. Na Rússia soviética, esse problema dará ainda pano para mangas. Mas voltemos ao vosso caso particular na Alemanha. O Partido não pode tolerar, em nenhum caso, semelhantes atos, não autorizados, por parte de seus membros. Isso confunde as coisas e desagrega nossas forças. Que fizestes para impedi-lo?» Sem esperar minha resposta, Lênin continuou: «A lista de vossos pecados, Clara, ainda não terminou. Ouvi dizer que, em vossas reuniões noturnas dedicadas à leitura e aos debates com as operárias, ocupai-vos sobretudo com as questões do sexo e do casamento. Esse assunto estaria no centro de vossas preocupações, de vossa instrução política e de vossa ação educativa! Não acreditei no que ouvi... Leia o artigo na íntegra acessando:http://www.marxists.org/portugues/zetkin/1920/mes/lenin.htm http://pcb.org.br Primeira Edição: Clara Zetkin — in Notas de Meu Diário. Lênin, Tal Como Era. Páginas escritas depois da morte de Lênin. Fonte: O Socialismo e a Emancipação da Mulher, Editorial Vitória, 1956. Tradução: Editorial Vitória. Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo, dezembro 2007. Direitos de Reprodução: A cópia ou distribuição deste documento é livre e indefinidamente garantida nos termos da GNU Free Documentation License. ANERI TAVARES.

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