sexta-feira, 19 de abril de 2013

Selvageria capitalista em tempos de colonização do outro Cabral: como recomeçar (mais uma vez)?



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Rodrigo Castelo
militante da Base ANDES/ FASUBRA do PCB-RJ abril/ 2013

"Se, então, fomos batidos, não temos outra coisa a fazer senão começar de novo desde o princípio" (Friedrich Engels)
Em 1851, sob as brasas das lutas revolucionárias e contrarrevolucionárias da Primavera dos Povos que ardiam em toda a Europa, Friedrich Engels escreveu, no jornal New York Daily Tribune, algumas linhas que podem servir para algumas reflexões dos militantes cariocas e fluminenses: “Não se pode imaginar uma derrota mais assinalável do que a sofrida pelo partido – ou antes: partidos – revolucionário continental em todos os pontos da linha de batalha. Mas, e daí? A luta das classes médias britânicas pela sua supremacia social e política não abarcou 48 anos e a das classes médias francesas 40 anos de lutas sem exemplo? E esteve alguma vez o seu triunfo mais próximo do que no preciso momento em que a monarquia restaurada se julgou mais firmemente estabelecida do que nunca?”.
É possível que muitos concordem que estamos diante de um bloco social dominante que goza de uma sólida supremacia no Rio de Janeiro. No plano econômico, o estado é atualmente uma das principais fronteiras da acumulação capitalista nacional, recebendo investimentos na casa da centena de bilhões de dólares nos setores de energia, infraestrutura, turismo/entretenimento, metal-mecânico e siderúrgico, dentre outros. A Cidade Maravilhosa foi escolhida como palco de megaeventos de entretenimento e de esportes, gerando um dinamismo para setores da burguesia local e internacional. Não é à toa que um dos principais empresários da lista dos mais ricos da revista Forbes, Eike Batista, seja um residente da cidade.
O capital demanda garantias políticas e jurídicas do Estado para a acumulação ampliada dos seus investimentos, assim como toda uma infraestrutura nos territórios a serem ocupados. Aqui no Rio de Janeiro, os governos estaduais e municipais, com apoio integral da União, cumpre com zelo o papel demandado pelo grande capital financeiro. Além de uma generosa política de concessões de benefícios fiscais e isenções tributárias para os empreendimentos capitalistas, as diversas esferas do Estado promovem um reordenamento da geografia urbana para os interesses de ocupação dos negócios capitalistas, em uma autêntica política de “higienização social” dos espaços públicos. Este é o caso, por exemplo, da Aldeia Maracanã, alvo da ação truculenta da Polícia Militar, sem mencionarmos remoções e despejos arbitrários de moradores na zona portuária e comunidades populares da cidade inteira.
No plano político, também estamos diante de uma dominação sem igual nos últimos tempos. Sérgio Cabral e Eduardo Paes reelegeram-se com facilidade, e contaram com o apoio de tradicionais partidos políticos e grupos sociais conservadores e até mesmo de agremiações que outrora foram progressistas, como PT, PCdoB e outros. Grande parte da legitimidade política dos governantes do PMDB deriva, inclusive, do apoio popular, costurado com a ocupação militar das comunidades populares, políticas sociais de transferência de renda, emprego formal (de baixa qualidade e remuneração e com altíssima rotatividade) e ações midiáticas.
Diante deste quadro de fortalecimento da supremacia das forças dominantes, não é incomum constatarmos um desânimo nos militantes que ainda resistem à política de transformação da nossa cidade e do nosso estado em uma fronteira avançada de acumulação imperialista. Todavia, a história das lutas de classes prega peças em seus combatentes e analistas. Se tivermos uma perspectiva dialética desta história, vamos lembrar, de acordo com Hegel, que o momento de auge de uma época histórica já se configura, contraditoriamente, com o seu momento de decadência.
Embora se reafirme aqui que nos encontramos em uma conjuntura histórica de descenso da força da classe trabalhadora e de ascensão da alta burguesia, é possível destacarmos alguns elementos presentes na atual conjuntura que nos permita vislumbrar fissuras no bloco dominante. Vamos aos fatos:
(1) No plano nacional, a queda nas taxas de crescimento econômico durante todo o governo Dilma resulta em maior dificuldade na redistribuição de parte do excedente econômico para as distintas classes. Em momento de crise, setores das classes dominantes, dado o seu poder econômico, político e cultural, conseguem abocanhar fatias maior do fundo público, restando menos para o atendimento das necessidades dos trabalhadores. Este problema se reflete também em termos regionais, como a partilha dos recursos do petróleo. Se estivéssemos em período de crescimento econômico, com maior arrecadação de tributos, o governo federal poderia disponibilizar recursos extras para os estados produtores de petróleo, compensando-os eventualmente pelas suas perdas;
(2) No plano regional, a coalização governista formada por PMDB e PT, até então sólida e segura, avaliada pelos mandarins do PT, desmancha-se com a briga pela indicação do senador Lindbergh Farias para a candidatura de governador ao estado em 2014. O atual residente do Palácio das Laranjeiras empurra goela abaixo a indicação do seu vice, um candidato sem expressão;
(3) O governo estadual usa crescente e intensivamente a coerção do aparato militar para dar garantias aos investimentos capitalistas e debelar manifestações contrárias aos seus interesses, como remoções arbitrárias, usuários indignados com os serviços prestados na área de transporte público etc. Aparentemente, a coerção militar dispersa focos de contestação e demonstra a força estatal, mas, no fundo, é uma demonstração de fraqueza política do Estado. Em tempos de crise estrutural, percebe-se o aumento da coerção como tática de conservação do poder, justamente com o objetivo de contrabalancear a perda de hegemonia do bloco dominante, tática menos custosa e mais sutil de manutenção da ordem.
No texto citado acima, Engels escreveu que, em tempos de derrotas históricas, o movimento revolucionário deve se recolher ao gabinete de estudo e pesquisar os motivos da derrota e planejar a sua reorganização política. Está na hora de começarmos a estudar o novo padrão de reprodução do capital implementado no Brasil nos últimos anos, bem como a nova pedagogia da hegemonia (o chamado social-liberalismo e suas imbricações com o novo-desenvolvimentismo) e o transformismo de grupos dirigentes da classe trabalhadora. A boa notícia é que não partiremos do zero, pois temos um acúmulo considerável nesta área, como as pesquisas desenvolvidas por coletivos marxistas presentes, em sua maioria (mas não somente), nas universidades públicas brasileiras e que começam a traçar projetos em comum com movimentos sociais, como as parcerias estabelecidas com o MST no Brasil inteiro.
Há, entretanto, uma segunda boa notícia no ar, que nos impulsiona para além dos gabinetes de estudo. O bloco dominante costurado pelo PT no plano nacional, talvez o mais forte constituído na Nova República, começa a mostrar sinais de desgaste com a crise capitalista mundial, a resistência dos subalternos e o aumento dos conflitos internos. Mesmo que tais fissuras no bloco dominante não sejam capazes de abalar a estrutura de poder montada pela alta burguesia no Rio de Janeiro (e no Brasil), elas já são perceptíveis e cada vez maiores. Abrem-se, assim, múltiplas possibilidades históricas para a atuação dos movimentos contestatórios à ordem, que precisam ter, além de uma excelente análise concreta da situação concreta, uma capacidade organizativa, de agitação e propaganda para atuar nas brechas abertas pelas falhas do sistema e aprofundar a crise do bloco dominante, disputando a direção intelectual-moral da sociedade brasileira e se mostrando como uma real alternativa de poder.
Esta é a nossa aposta! Esta é a nossa luta!

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