sábado, 16 de agosto de 2014

UPP E AS DUAS FACES DA MESMA MOEDA

15 AGOSTO 2014 
Hiran Roedel)
Em 2007, o Secretário de Segurança do estado do Rio de Janeiro fez a seguinte afirmação: “Um tiro em Copacabana é uma coisa, na Favela da Coréia é outra”. Três anos depois, já em funcionamento diversas Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), alegou que o que se pretendia com a UPP era: "...criar uma ambiência para as pessoas que vivem ali e, a partir dela, criar outra polícia". Contudo, em 2013, o Secretário dizia que: “Para fazer a intervenção (nas favelas) de verdade, vamos entrar na discussão das remoções. Hoje remoção é tabu, é palavra proibida, porque colocaram ideologia no debate”. Poderíamos buscar outras declarações que revelam o perfil político-ideológico que orienta a segurança pública do estado, mas creio já ser o suficiente.
Cabe antes esclarecer, no entanto, que a ideologia a que se refere o Secretário é a luta por outro consenso que rompa a lógica da remoção e afirme o direito à moradia das classes populares. Ou seja, uma luta contra a subordinação da política pública aos interesses do capital especulativo imobiliário. Porém, quando é detectado risco aos interesses dos donos do poder, a repressão àqueles que os incomodam é a resposta. Por isso, o aparelho policial se afirma como fundamental e a Polícia Militar do Rio de Janeiro (PMRJ) se encontra no centro desse debate. Portanto, compreender o perfil ideológico dessa instituição, que é a mão mais visível do poder público para a maioria dos trabalhadores, é essencial.
Desde sua origem, em 1809, a PMRJ teve como objetivo garantir a segurança da classe dominante residente na cidade do Rio em relação aos indivíduos que mais lhes aterrorizavam: as pessoas escravizadas. Estas deveriam ser mantidas em guetos e apavoradas pelo poder como estratégia de dominação. Percebe-se, então, que essa instituição traz consigo um vício de origem: a seletividade de classe em suas ações.
Mas vícios de origem podem ser superados. Entretanto, eles não se superam por si só e nem por decretos, mas por projetos de sociedade. Como os projetos de Brasil sempre foram carregados de preconceitos em relação às classes populares e trabalhadoras, o aparelho policial constantemente foi acionado para garantir a “ordem natural” do processo a partir da submissão dessas.
Para legitimar essas ações, como de hábito, não faltaram argumentos “científicos”. Ou seja, “estudos”, sustentados por duvidosa cientificidade, que chegavam a classificar que pobres, negros ou qualquer outro indesejado político tinham em sua origem genética tendência criminosa. A solução, portanto, era simples: o encarceramento. Essa “cientificidade”, por sua vez, alimentou o senso comum que em uma radicalidade paradoxal entende, também, a eliminação dessas “classes perigosas” como caminho razoável e aceitável.
Como consequência, o lado perverso que tem batido às nossas portas é que de 2011 a 2012, no estado do Rio, registrou-se um aumento de 7,1% no índice de mortes sem solução, passando de 2.456 para 3.619. Uma realidade acompanhada de perto pelo restante do país, o que é agravado pela existência dos chamados autos de resistência ao se constatar que, de 2000 a 2012, cinco pessoas morreram por dia em confrontos com a polícia.
Em 25/07/2014, o Jornal do Brasil publicou: “PM do Rio e de SP mata mais que países com pena de morte”. No estado do Rio de Janeiro foram, em 2011, 534 pessoas mortas pela Polícia Militar, e, em São Paulo, segundo esse mesmo jornal, 437 assassinatos nas mesmas condições. Considerando como verdadeiras essas informações, tendo ocorrido no Rio 4.280 homicídios dolosos, em 2011, os autos de resistência constituem uma taxa de uma morte para cada 9,17 assassinatos no estado.
Mas quem são essas pessoas? A maioria é jovem, pobre, de baixa escolaridade e morador de favela e/ou da periferia. Essa condescendência da sociedade para com o extermínio levou à elevação de 70% nas mortes em confronto com a polícia fluminense entre janeiro de 2013 e janeiro de 2014, segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP).
Mas e as UPPs? A partir delas não se ia “criar outra polícia”?
A implantação destas resultou em uma queda de 75% no número de homicídios, de acordo com os dados oficiais, o que poderia indicar um novo comportamento dessa polícia. Porém, logo vemos o outro lado da moeda: no mesmo período aumentou em 92% o número de desaparecimentos nessas áreas.
Isso nos leva à seguinte constatação: o vício de origem permanece, mas mudou de tática. Sendo assim, fica evidente que a criação das UPPs, mesmo que hipoteticamente fosse uma política bem intencionada, não haveria a possibilidade de se constituir em algo muito diferente da lógica de segurança perpetuada por mais de 200 anos, pois o extermínio das “classes perigosas” continua a ser o princípio norteador da PMERJ. Nesse caso, podemos compreender que, UPP e PM, são duas faces da mesma moeda!
Fontes Consultadas:

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