Crédito: Rodrigo Vianna | |
publicada quarta-feira, 16/05/2012 às 11:18 e atualizada quarta-feira, 16/05/2012 às 15:04
No Brasil, tentariam igualar Aubrac a nazistas?
por Rodrigo Vianna
Raymond Aubrac morreu no mês passado.
Tinha 97 anos, viúvo. Na França, era tratado como herói. Lutou de armas
na mão contra os nazistas e contra os franceses colaboracionistas, que
aceitaram manter um regime fantoche em apoio a Hitler.
Aubrac e a mulher, morta há uma década, foram líderes da Resistência Francesa.
Se morassem no Brasil, parte dos comentaristas e colunistas da direita
brazuca certamente diria que eles tinham sido ”terroristas”. Sim, Aubrac
lançou bombas, deu tiros. Foi preso, escapou milagrosamente dos
nazistas. Tinha inimigos. E lutou. E não deixou de lutar. Depois da
Guerra, tornou-se amigo de Ho-Chi-Min. E na última campanha eleitoral
francesa, chegou a declarar apoio a Hollande, do Partido Socialista. Ele
tinha um lado.
Um homem precisa ser “neutro” pra lutar
por Justiça? Tolice. Mais que tolice. Argumento falacioso a proteger
criminosos de guerra. Seja na Europa ou na América do Sul. Aqui, às
vezes cola. Lá, não cola…
No Brasil, Aubrac e a mulher talvez
fossem chamados de “petralhas”. Mais que isso. Talvez aparecesse um
ex-ministro tucano dizendo que “os dois lados” precisam ser
investigados. Sim! Não é justo julgar (ou relatar os crimes, que seja)
apenas dos pobres nazistas. E as “vítimas inocentes” do “outro lado”?
Essa Resistência Francesa era “criminosa”…
Aubrac seria exercrado, ofendido. Pela
internet, circulariam e-mails idiotas chamando o sujeito de
“terrorista”, talvez achassem uma foto dele com fuzil pra dizer: olha
só, o “outro lado” era adepto da força bruta, não era bonzinho, também
precisa ser investigado…
Isso me lembra o título daquele livro:
“Falta Alguém em Nuremberg!” Sim, para a direita brasileira (e os
apavorados que se acham de esquerda e têm medo de enfrentá-la) seria
preciso enviar a Resistência Francesa a julgamento! Afinal, a
Resistência pegou em armas, cometeu “crimes”.
No Brasil, por hora, nem se fala em
julgamento. Mas numa simples Comissão a relatar os crimes cometidos por
agentes do Estado. Crimes contra a Humanidade. Não se fala em execrar
soldados, sargentos ou oficiais que, eventualmente, tenham matado
guerrilheiros em combate. Da mesma forma, nunca ninguém se atreveu a
“condenar” soldados alemães que lutaram nas trincheiras ou nas ruas.
O que se pretende é relatar crimes de
tortura, desaparecimento, assassinatos cometidos a sangue frio… Ah, mas
estávamos numa “guerra”, dizem militares brasileiros (secundados por
civis perversos, e até por gente de boa fé mas desinformada) que atacam
a Comissão. Há controvérsias se aquilo que ocorreu no Brasil foi uma
“guerra”…
De todo jeito, na Europa houve “guerra”.
Pra valer. Nem por isso, crimes contra a Humanidade deixaram de ser
julgados. Nazistas e seus colaboradores que torturaram, assassinaram e
incineraram gente indefesa foram a julgamento. A Resistência Francesa
não foi a julgamento. Nem irá.
O resto é invenção do conservadorismo
mais matreiro do mundo, porque dissimulado: o conservadorismo
brasileiro. Nesse debate sobre a Comissão da Verdade, é preciso
derrotá-lo. Com inteligência, moderação. Mas com firmeza.
http://www.rodrigovianna.com.br/palavra-minha/investigar-o-outro-lado-na-ditadura-seria-como-igualar-nazistas-a-resistencia-francesa.html
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