Crédito: PCB | |
Casa de Detenção - Rio de Janeiro, 12/8/36
Dª. Ermelinda.
Afetuosos cumprimentos.
Conhecendo-a há bastante tempo, pelas
muitas vezes que o Carlos se tem referido a seu nome, resolvi
escrever-lhe, não só para lhe dar notícias nossas, como também para
iniciarmos as nossas relações mais íntimas, pois tenho a esperança que
nós ainda nos encontraremos e mesmo que a senhora irá conhecer o seu
bisneto.
Quero dar-lhe notícias nossas, somente
as principais, pois será difícil descrever-lhe todos os incidentes dos
nossos longos meses de prisão. Numa das vezes em que fui chamada à
Polícia Central, o Dr. Belens Porto, encarregado do inquérito, me disse
que a Senhora havia escrito uma carta ao Carlos. Não sei, porém, se tal
carta terá chegado às mãos do destinatário, nem se a Polícia terá
permitido que ele respondesse.
O Carlos continua no quartel da Polícia
Especial, numa incomunicabilidade completa, que já dura há mais de 5
meses. As autoridades não consentem que ele leia jornais e nem mesmo
livros. Ele se encontra isolado, numa sala, a porta daquela ficando
sempre aberta, para permitir aos guardas uma vigilância permanente. – A
Senhora poderá bem imaginar quanta energia deve custar ao Carlos
enfrentar todas estas torturas morais. – Talvez os antigos companheiros e
amigos do Carlos possam auxiliar no sentido de que pelo menos livros e
revistas lhe sejam entregues.
Da Europa, D. Leocadia já me escreveu,
mas sob o pretexto de minha incomunicabilidade, a Polícia impediu a
entrega da carta, como também não tive a possibilidade de escrever-lhe.
Soube, porém, que ela tem desenvolvido uma grande atividade no sentido
da defesa do Carlos.
Quanto a mim, estou, nestes últimos
tempos, mais confortada pela presença de várias companheiras de prisão,
que já se tornaram minhas amigas. No começo estive também incomunicável.
Ultimamente, porém, fui transferida para a sala das mulheres, presas
políticas, na Casa da Detenção. Assim é que vim a conhecer entre outras,
a Rosa, irmã do Silo, e a Maria Werneck, cujo marido está também preso e
que descende de uma família gaúcha.
De saúde, tenho tido bastantes abalos,
provocados de um lado pela gravidez (agora já no sétimo mês) devido às
condições da prisão, como ainda mais pelas aflições que me dá a
inquietude sobre o estado do Carlos. Até hoje e depois da nossa prisão
não tive a possibilidade de vê-lo e só recebi algumas cartas dele, em
que falava do nosso filho e das providências relativas à nossa defesa.
Corre um processo de expulsão contra
mim, por ter eu nascido no estrangeiro. Numa de suas cartas o Carlos
comenta este passo do Governo da seguinte maneira: “Tu compreendes que o
teu processo de expulsão é a forma jurídica encontrada pelo atual
governo para tornar efetivo mais um ato de perseguição política contra
mim... Preciso assistir com coragem aos golpes que, impotentes para
assestarem diretamente contra mim, dirigem contra as pessoas a quem
dedico o meu maior afeto.”
Enfrentando tais perseguições absurdas e
diante dos golpes da reação, asseguro à Senhora que, com a mesma
coragem com que anteriormente acompanhei o Carlos na luta,
mostrar-me-ei, agora, digna do nome dele.
A respeito da minha expulsão, estou
confiante que a simpatia pública impeça este ato completamente fora da
lei e espero que darei à luz ao filho do Carlos aqui em terra
brasileira.
Era o que de essencial eu tinha a dizer nessa primeira carta, que lhe escrevo.
Queira receber um afetuoso abraço de sua neta
Maria**
*Carta escrita na Casa de Detenção (RJ),
onde Olga estava presa desde março de 1936, antes de ser extraditada
para a Alemanha nazista pelo governo de Getúlio Vargas, em setembro
daquele ano, no sétimo mês de gravidez.
**Olga nunca reconheceu, perante a
polícia, seu verdadeiro nome e sua verdadeira nacionalidade; com firmeza
revolucionária, reafirmou sempre o nome que constava no passaporte -
Maria Vilar.
Arquivo Alfredo Felizardo (RS)
FONTE: Instituto Luiz Carlos Prestes
Nenhum comentário:
Postar um comentário