Rodrigo Castelo
militante da Base ANDES/ FASUBRA do PCB-RJ abril/ 2013
"Se, então, fomos batidos, não temos outra coisa a fazer senão começar de novo desde o princípio" (Friedrich Engels)
Em 1851, sob as brasas das lutas revolucionárias e
contrarrevolucionárias da Primavera dos Povos que ardiam em toda a
Europa, Friedrich Engels escreveu, no jornal New York Daily Tribune,
algumas linhas que podem servir para algumas reflexões dos militantes
cariocas e fluminenses: “Não se pode imaginar uma derrota mais
assinalável do que a sofrida pelo partido – ou antes: partidos –
revolucionário continental em todos os pontos da linha de batalha. Mas, e
daí? A luta das classes médias britânicas pela sua supremacia social e
política não abarcou 48 anos e a das classes médias francesas 40 anos de
lutas sem exemplo? E esteve alguma vez o seu triunfo mais próximo do
que no preciso momento em que a monarquia restaurada se julgou mais
firmemente estabelecida do que nunca?”.
É possível que muitos concordem que estamos diante de um bloco social
dominante que goza de uma sólida supremacia no Rio de Janeiro. No plano
econômico, o estado é atualmente uma das principais fronteiras da
acumulação capitalista nacional, recebendo investimentos na casa da
centena de bilhões de dólares nos setores de energia, infraestrutura,
turismo/entretenimento, metal-mecânico e siderúrgico, dentre outros. A
Cidade Maravilhosa foi escolhida como palco de megaeventos de
entretenimento e de esportes, gerando um dinamismo para setores da
burguesia local e internacional. Não é à toa que um dos principais
empresários da lista dos mais ricos da revista Forbes, Eike Batista,
seja um residente da cidade.
O capital demanda garantias políticas e jurídicas do Estado para a
acumulação ampliada dos seus investimentos, assim como toda uma
infraestrutura nos territórios a serem ocupados. Aqui no Rio de Janeiro,
os governos estaduais e municipais, com apoio integral da União, cumpre
com zelo o papel demandado pelo grande capital financeiro. Além de uma
generosa política de concessões de benefícios fiscais e isenções
tributárias para os empreendimentos capitalistas, as diversas esferas do
Estado promovem um reordenamento da geografia urbana para os interesses
de ocupação dos negócios capitalistas, em uma autêntica política de
“higienização social” dos espaços públicos. Este é o caso, por exemplo,
da Aldeia Maracanã, alvo da ação truculenta da Polícia Militar, sem
mencionarmos remoções e despejos arbitrários de moradores na zona
portuária e comunidades populares da cidade inteira.
No plano político, também estamos diante de uma dominação sem igual
nos últimos tempos. Sérgio Cabral e Eduardo Paes reelegeram-se com
facilidade, e contaram com o apoio de tradicionais partidos políticos e
grupos sociais conservadores e até mesmo de agremiações que outrora
foram progressistas, como PT, PCdoB e outros. Grande parte da
legitimidade política dos governantes do PMDB deriva, inclusive, do
apoio popular, costurado com a ocupação militar das comunidades
populares, políticas sociais de transferência de renda, emprego formal
(de baixa qualidade e remuneração e com altíssima rotatividade) e ações
midiáticas.
Diante deste quadro de fortalecimento da supremacia das forças
dominantes, não é incomum constatarmos um desânimo nos militantes que
ainda resistem à política de transformação da nossa cidade e do nosso
estado em uma fronteira avançada de acumulação imperialista. Todavia, a
história das lutas de classes prega peças em seus combatentes e
analistas. Se tivermos uma perspectiva dialética desta história, vamos
lembrar, de acordo com Hegel, que o momento de auge de uma época
histórica já se configura, contraditoriamente, com o seu momento de
decadência.
Embora se reafirme aqui que nos encontramos em uma conjuntura
histórica de descenso da força da classe trabalhadora e de ascensão da
alta burguesia, é possível destacarmos alguns elementos presentes na
atual conjuntura que nos permita vislumbrar fissuras no bloco dominante.
Vamos aos fatos:
(1) No plano nacional, a queda nas taxas
de crescimento econômico durante todo o governo Dilma resulta em maior
dificuldade na redistribuição de parte do excedente econômico para as
distintas classes. Em momento de crise, setores das classes dominantes,
dado o seu poder econômico, político e cultural, conseguem abocanhar
fatias maior do fundo público, restando menos para o atendimento das
necessidades dos trabalhadores. Este problema se reflete também em
termos regionais, como a partilha dos recursos do petróleo. Se
estivéssemos em período de crescimento econômico, com maior arrecadação
de tributos, o governo federal poderia disponibilizar recursos extras
para os estados produtores de petróleo, compensando-os eventualmente
pelas suas perdas;
(2) No plano regional, a coalização
governista formada por PMDB e PT, até então sólida e segura, avaliada
pelos mandarins do PT, desmancha-se com a briga pela indicação do
senador Lindbergh Farias para a candidatura de governador ao estado em
2014. O atual residente do Palácio das Laranjeiras empurra goela abaixo a
indicação do seu vice, um candidato sem expressão;
(3) O governo estadual usa crescente e
intensivamente a coerção do aparato militar para dar garantias aos
investimentos capitalistas e debelar manifestações contrárias aos seus
interesses, como remoções arbitrárias, usuários indignados com os
serviços prestados na área de transporte público etc. Aparentemente, a
coerção militar dispersa focos de contestação e demonstra a força
estatal, mas, no fundo, é uma demonstração de fraqueza política do
Estado. Em tempos de crise estrutural, percebe-se o aumento da coerção
como tática de conservação do poder, justamente com o objetivo de
contrabalancear a perda de hegemonia do bloco dominante, tática menos
custosa e mais sutil de manutenção da ordem.
No texto citado acima, Engels escreveu que, em tempos de derrotas
históricas, o movimento revolucionário deve se recolher ao gabinete de
estudo e pesquisar os motivos da derrota e planejar a sua reorganização
política. Está na hora de começarmos a estudar o novo padrão de
reprodução do capital implementado no Brasil nos últimos anos, bem como a
nova pedagogia da hegemonia (o chamado social-liberalismo e suas
imbricações com o novo-desenvolvimentismo) e o transformismo de grupos
dirigentes da classe trabalhadora. A boa notícia é que não partiremos do
zero, pois temos um acúmulo considerável nesta área, como as pesquisas
desenvolvidas por coletivos marxistas presentes, em sua maioria (mas não
somente), nas universidades públicas brasileiras e que começam a traçar
projetos em comum com movimentos sociais, como as parcerias
estabelecidas com o MST no Brasil inteiro.
Há, entretanto, uma segunda boa notícia no ar, que nos impulsiona
para além dos gabinetes de estudo. O bloco dominante costurado pelo PT
no plano nacional, talvez o mais forte constituído na Nova República,
começa a mostrar sinais de desgaste com a crise capitalista mundial, a
resistência dos subalternos e o aumento dos conflitos internos. Mesmo
que tais fissuras no bloco dominante não sejam capazes de abalar a
estrutura de poder montada pela alta burguesia no Rio de Janeiro (e no
Brasil), elas já são perceptíveis e cada vez maiores. Abrem-se, assim,
múltiplas possibilidades históricas para a atuação dos movimentos
contestatórios à ordem, que precisam ter, além de uma excelente análise
concreta da situação concreta, uma capacidade organizativa, de agitação e
propaganda para atuar nas brechas abertas pelas falhas do sistema e
aprofundar a crise do bloco dominante, disputando a direção
intelectual-moral da sociedade brasileira e se mostrando como uma real
alternativa de poder.
Esta é a nossa aposta! Esta é a nossa luta!
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