Ivan Pinheiro (*)
Desde Havana, onde cumpro agenda política de iniciativa do PCB, tenho o privilégio de olhar a conjuntura internacional sem as lentes turvas da mídia burguesa.
A leitura diária do Granma e a assistência noturna dos canais de televisão cubanos e venezuelanos permitem o conhecimento de notícias que, no Brasil, só obtemos através de fontes alternativas.
Todos os meios de comunicação brasileiros são burgueses e, entre estes, os hegemônicos são do campo da direita política aliada ao imperialismo, sobretudo o norte-americano. Rigorosamente, todos os jornais diários e todos os canais de televisão e rádio abertos defendem os privilégios e cultuam os valores da ordem capitalista.
A rica troca de informações e pontos de vista com camaradas cubanos, venezuelanos, colombianos e jovens comunistas brasileiros que estudam na ilha rebelde são também importante fonte de conhecimento.
Este primeiro comentário desde Havana dedico a um dia que ficará na história. O 10 de janeiro de 2013 passou sem que a oligarquia venezuelana e o aparato midiático imperialista lograssem criar um clima de golpe e desestabilização política que vinham urdindo desde que surgiram indícios de que Hugo Chávez não teria condições de saúde para estar em Caracas para o juramento de posse, uma formalidade transformada em cláusula pétrea e sine qua non.
A montanha pariu um rato. A oposição de direita não conseguiu realizar qualquer ato público significativo e suas ameaças caíram no ridículo. Enquanto isso, em torno do Palácio Miraflores, em Caracas, uma multidão incalculável promoveu uma combativa e emotiva manifestação, sob a consigna Todos Somos Chávez, em cujo momento culminante o povo jurou uníssono perante a constituição nacional, blindou e legitimou a posse de Chávez e a interinidade de Nicolás Maduro, de fato e de direito.
No Brasil e em outros países manipulados pela mídia burguesa, certamente a posse foi apresentada sem o calor popular e como um “golpe contra as liberdades democráticas”, cinicamente por aqueles que não respeitam os direitos dos trabalhadores e dos povos. Para manter seus privilégios, satanizam líderes e países adversários, transformam em “ação humanitária” a repressão, a intervenção militar, as guerras de rapina, os covardes assassinatos em massa e seletivos.
Caracas e Havana foram palcos, nos últimos dias, da mais ampla e expressiva solidariedade latino-americana da história recente. Representantes dos governos de 22 países da região estiveram presentes no dia 10 de janeiro no ato público de massas de respaldo a Hugo Chávez e ao povo venezuelano.
No ato, podíamos ver Evo Morales, Daniel Ortega, José Mujica, presidentes e mandatários de todos os países da ALBA e da Petrocaribe e até mesmo o presidente legítimo do Paraguai, Fernando Lugo.
Mais do que a importante manifestação popular, este abraço coletivo dos governos latino-americanos marcou de legitimidade o ato simbólico de posse, que já tinha a legalidade do Tribunal Superior venezuelano. O amplo apoio continental foi decisivo até para que a OEA, para constrangimento dos Estados Unidos, convalidasse o ato jurídico e político como perfeito. Este apoio silenciou a boca maldita da direita, que certamente não desistirá de tentar desestabilizar o governo e o país.
Em 11 de janeiro, alguns representantes de governos que não puderam comparecer ao ato da véspera, em Caracas, vieram a Havana saudar Fidel, Raul e o povo cubano e estar pessoalmente com Hugo Chávez, para lhe visitar e respaldar, incluindo Cristina Kirchner e Ollanta Humala.
Infelizmente, não se pode deixar de lembrar os poucos governos latino-americanos ausentes, seja em Caracas, seja em Havana.
Não foi surpresa a ausência dos governos de direita da região (Chile, Colômbia, México e os golpistas de Honduras e Paraguai). Mas foi triste e decepcionante a ausência do governo social-liberal brasileiro, ainda equivocadamente percebido por parte da esquerda mundial como um governo progressista e até anti-imperialista, quando em verdade é um governo da ordem, que administra com competência a vertiginosa expansão do capitalismo no país e no exterior, mitigando a pobreza com as migalhas de políticas compensatórias.
Como eu estava no Brasil até o dia 9 de janeiro, assistindo ao massacre midiático contra o “golpe de Chávez”, posso entender uma das razões dessa ausência: o governo brasileiro é pautado pela mídia burguesa, frente à qual “bota o rabo entre as pernas”, para usar uma expressão popular em meu país.
Mas há outro fator de natureza objetiva. O pragmatismo da política externa do estado burguês brasileiro não pode politizar nem ideologizar as relações bilaterais. Trata-se também de uma sinalização de que, com ou sem revolução bolivariana, a relação comercial continua com a Venezuela!
O Brasil que investe em Cuba e na Venezuela é o mesmo que tem como importantes parceiros comerciais a Colômbia e Israel.
Havana, 12 de janeiro de 2013
(*) Ivan Pinheiro é Secretário Geral do PCB
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